Mesmo só, quando ao pé do fogo da lareira
Ponho-me a recordar o que fui e o que sou,
A minha sombra - a eterna companheira
Que em dias bons e maus sempre me acompanhou,
Fica perto de mim de tal maneira
Que não parece sombra. É alguém que ali ficou.
Somos dois. Cada qual mais triste e mais calado.
Anda lá fora o luar garoando no jardim...
Tenho pena da sombra imóvel a meu lado
Possuída da expressão de um silencio sem fim.
E recordo em voz alta o meu tempo passado
E a sombra chega mais para perto de mim.
Ah! Quem me dera ter um bem que se pareça,
Que lembre vagamente outro que longe vai:
As mãos da minha Mãe sobre a minha cabeça,
O consolo de amigo e a fala do meu Pai.
E antes que a noite passe e a alma se me enterneça,
Abro a janela e espio a lua que se esvai...
Qual! É inútil. Por mais que esta lembrança esqueça,
Uma lágrima cresce em meus olhos e cai...
Deus há de permitir que eu adormeça
Com as mãos de minha Mãe sobre a minha cabeça,
Ouvindo a fala comovida de meu pai.
Olegário Mariano
In Quando Vem Baixando o Crepúsculo
sábado, 18 de janeiro de 2014
sábado, 11 de janeiro de 2014
Pinturas do século XVI descobertas na igreja matriz de Valbom
Dois painéis
de pintura portuguesa a óleo sobre madeira de carvalho, datáveis da segunda
metade do seculo XVI, foram encontrados na parte do tardoz do retábulo de talha
barroca da igreja matriz de Valbom. A descoberta foi feita por Joana Pereira,
da Comissão Diocesana de Arte Sacra, no âmbito de um Projeto de Inventario do
Património Religioso, Imóvel e Móvel, existente na Diocese da Guarda, em curso
desde 2007. A alta importância da descoberta destas pinturas, que pertenceram a
um desmantelado conjunto retabular da antiga igreja, abriu a possibilidade de
se levar a efeito a remoção, salvaguarda, conservação e adequada
“musealização”, no local, das pinturas de Nossa Senhora da Assunção e de São
Pedro. São duas obras de arte sacra, de uma oficina regional desconhecidas
tanto na vertente histórico-artística, como na cultural. As pintural que até ao
dia 19 de Setembro de 2013, permaneceram enigmaticamente silenciosas no tardoz
do retábulo do altar-mor da igreja matriz de Valbom, foram recentemente
conservadas pelos técnicos de conservação e restauro do Instituto de
Conservação e Restauro e Salvaguarda do Património, sediado em Tortosendo. O
processo de conservação que ocorreu entre Setembro e Dezembro de 2013, previu a
desinfestação, limpeza, consolidação e proteção das pinturas que atualmente
adornam a nave do templo religioso, cumprindo a missão religiosa para as quais
foram originalmente realizadas. Nossa Senhora da Assunção (altura de 183,6 x
largura 70) surge representada, no registo superior, com o crescente lunar aos
pés, ladeada de anjos e com o túmulo representado no registo inferior. São
Pedro (altura 144 x largura 54,8) apresenta-se como um homem de compleição
robusta, velho, com barbas curtas e calvo. Aparece vestido como apóstolo e nas
mãos sustenta dois dos atributos com que vulgarmente é representado: as chaves
(dos Céus, que Jesus Cristo lhe terá confiado) e o livro. De acordo com Joana
Pereira, “ as pinturas encontradas são muito interessantes e vêm valorizar o
património histórico-artístico e religioso quer da paróquia quer do território
da Diocese da Guarda onde os exemplares de pintura são pouco numerosos e, no
geral de modesto merecimento”. No Arciprestado de Pinhel o inventário realizado
passou por 89 edifícios o que se traduziu na inventariação de 831 metais, 699
esculturas, 93 têxteis, 45 objetos incluídos na categoria de espólio
documental, 39 pinturas, 26 peças de mobiliários, 3 equipamentos e utensílios e
dois objetos devocionais. Paróquia muito antiga Valbom é uma freguesia e
paróquia do arciprestado e concelho de Pinhel. Antigamente, Valbom conheceu uma
considerável importância. No arrolamento paroquial de 1320, a igreja de Valbom
foi taxada em 110 libras e em meados do seculo XVIII os rendimentos da paróquia
igualavam os da paróquia de Santa Maria do Castelo de Pinhel. De cariz rural
esta terra destaca-se pelo vasto património. É uma das freguesias mais antigas
do termo de Pinhel e a sua igreja de traça românica parece remontar ao início
da nacionalidade. A sua instituição paroquial data dos seculos XIII / XIV.
Atualmente esta paróquia tem como pároco o padre Ricardo Fonseca.
Informação
retirada do site:
http://www.diocesedaguarda.pt/component/content/article/55/1002
Nossa Senhora da Assunção
Igreja Matriz de Valbom
segunda-feira, 6 de janeiro de 2014
Dia de Reis
Por cá, cantava-se
com os seguintes versos:
Vamos cantar
as janeiras
Vamos
cantar as janeiras
Por esses
quintais adentro vamos
Às
raparigas solteiras
Vamos cantar orvalhadas
Vamos cantar orvalhadas
Por esses quintais adentro vamos
Às raparigas casadas
Vira o vento e muda a sorte
Vira o vento e muda a sorte
Por aqueles olivais perdidos
Foi-se embora o vento norte
Muita neve cai na serra
Muita neve cai na serra
Só se lembra dos caminhos velhos
Quem tem saudades da terra
Quem tem a candeia acesa
Quem tem a candeia acesa
Rabanadas, pão e vinho novo
Matava a fome à pobreza
Já nos cansa esta lonjura
Já nos cansa esta lonjura
Só se lembra dos caminhos velhos
Quem anda à noite à ventura
Ou também
Ano Novo, Ano Novo
Ano novo melhor ano
Viemos cantar as janeiras
Como é lei de cada ano
Se nos as vai dar
Não esteje a demorar
Somos romeiros de longe
Não podemos cá voltar
Oh que casinhas tao altas
Forradas de papelão
Levante-se minha senhora
E venha-nos dar um salpicão
(E se não dessem nada)
Estes barbas de farelo
Não tem nada para nos dar
Só tem um caixote podre
Onde os ratos vão cagar
quarta-feira, 1 de janeiro de 2014
A apanha da azeitona
De vez em quando vou até ai…
gosto disso, dessa terra, dessa penedia a quem o tempo deu um ar macio de
travesseiro, amansando as arestas, e que no entretanto fez essa terra fértil que
tudo cria. A última vez fui à azeitona… e tento deixar-vos o que senti… Pinhel
/ Valbom 15 de Dezembro de 2012
A apanha da azeitona tem
significados diferentes para espíritos diferentes. Para uns representa apenas
um trabalho, mais duro que os outros, quer por força dos rigores do tempo, quer
pela dureza da tarefa em si. Para outros ainda, reveste-se do misticismo que a associação
ao azeite propícia. Afinal a azeitona é apreciada em tantas vertentes que não a
valorizar é uma heresia. Em terras de Valbom, para a maioria das pessoas, parece
ser apenas um trabalho difícil, mas que precisa ser feito, cumprindo os tempos adequados,
pois que só o frio curte a azeitona ate lhe deixar o precioso azeite em termos
de ser extraído. De Coimbra partem visitantes de dois tipos, já assíduos e
batidos nesse trabalho, outro ainda verde e virgem. Uns levam alguma apreensão porque
sabem da dureza que vão enfrentar, outro leva algum receio pelo que lhe foi
dito, que depois é acrescido por saber que outras pessoas, para além das do
costume, aquelas que já conhece e que a conhecem, estarão no campo. Fica o
receio de não ser capaz de cumprir, sabendo contudo que dará o seu melhor, o
que fizer será o melhor que consegue. Chegam a Valbom já bem perto das nove,
porque foram alguns os entraves logísticos que se colocaram à viagem. O frio
que aterrorizou as mentes esqueceu-se de vir e mesmo a chuva, que tão anunciada
foi, parece estar para outras paragens. Os trabalhos já tinham sido começados e
os visitantes, com a farpela de trabalho vestida apenas tiveram que pegar na
ferramenta. Para ele estava um varapau à espera, com o qual iria vergastar as
oliveiras pra lhe arrancar as azeitonas. Para elas esperavam as lonas e os
baldes (que por estas terras tem outros nomes!). As primeiras servem para
forrar o chão e apanhar as azeitonas que os homens com a força de braços
derrubam. Os baldes permitem recolher as azeitonas que se escapam ou que o
vento já se tinha encarregue de varejar, este sim é um trabalho duro, que verga
as costas e desgasta os dedos, por força da fricção com o restolho das ervas ou
com as lamas deixadas pela chuva. Para quem assiste pela primeira vez o espetáculo
é doloroso. Dói ver as jovens oliveiras a ser vergastadas com força, mesmo sem
ser com violência, que é um bater duro mas doce, se a antítese for permitida.
Sente-se a gratidão da colheita na forma como se manuseia o varapau. Para quem
apanha as lonas não é muito duro, exige alguma velocidade e destreza mas nada
de transcendente. Por volta das dez horas come-se o farnel, que a Lucinda
arranjou com carinho e desveio, pão e queijo, bola de carne, bolo-rei que o
tempo já sido nos lembra e vinho para temperar a lama. E de novo se começa o
trabalho, com uma ou outra ameaça de chuva (que umas conversas com S. Pedro vão
resolvendo) mas com uma falta de frio que obriga a despir as sucessivas camadas
de roupa. Para quem estas lides são novidade é delicioso olhar para as
azeitonas e sentir as suas rugas, aperta-las entre os dedos e sentir que por
baixo da aparente dureza se esconde uma polpa suave e mole. Até apetece comer,
mas memórias de experiencias de infância fazem assomar um sorriso aos olhos e
deixar os apetites para depois, com outras, que a água e o sal tenham tornado
mais doces. São feitos os mesmos caminhos que em Setembro permitiram recolher
as uvas. Esta terra produz em abundancia dois dos mais preciosos líquidos da
cultura gastronómica do nosso país, o vinho e o azeite. Não deixa de ser
interessante constatar que os locais que os acolhem são os mesmos. Será a
terra? Será o clima? Será o casamento de ambos, terra e clima, que permite a
proximidade de oliveiras e videiras em perfeita harmonia? É uma terra abençoada
esta… por aqui tudo se cria, numa completa antítese às leis de Lavoisier,
parece quase um desafio… Embora com dificuldade, conseguiu fazer-se toda a
colheita. De regresso a casa falta ainda erguer todo o fruto para eliminar as
folhas que foram varejadas junto com as azeitonas. Este processo consiste em
fazer passar os frutos por uma máquina que possui uma ventoinha que faz sair as
folhas e recolhe os frutos. Este sim é um trabalho duro que obriga a um esforço
físico intenso, sobretudo para quem passou o dia a manusear um varapau mais ou
menos pesado. No atrelado do trator, essa ferramenta de trabalho preciosa que
tanto poupa aos braços dos homens e mulheres e às pernas dos burros, são transportadas
as azeitonas, quando se enche a azeitona para os baldes, potes por estas
bandas, o chão vai-se tornando mais e mais escorregadio graças às azeitonas
esmagadas pelos pés, que vão libertando os seus sucos, deixando uma pelicula de
gordura que obriga a um exercício de cuidado continuo para evitar o tombo. Por baixo,
junto à máquina, o encher dos sacos obriga os homens a um cuidado e a uma
destreza para impedir que se derrame azeitona e assim evitar mais trabalho.
Quando as ultimas azeitonas foram vertidas para a máquina o corpo foi
autorizado a acusar algum cansaço, faltava apenas arrumar o folhedo e depois
rumar ao banho e à janta que a hora era chegada. Para esse jantar estava
prevista uma feijoada de cogumelos, que embora tardia acabou por sair. O serão,
esse foi como sempre em casa do Pedro, longo, muito longo, com a conversa que
se faz à volta de um (ou vários!) copo e um queijo. O domingo chegou rápido e
com bastante chuva, mesmo assim permitiu uma saída rápida até à horta para colher
umas nabiças, uns grelos e umas couves que mais tarde, e mais para sul, ajudam
a mitigar alguma nostalgia que deixam a terra e as gentes de Valbom.
Autoria: Anabela Bragança
Subscrever:
Mensagens (Atom)