sábado, 28 de março de 2015

Sonhos Rurais e Reais

Sonhava contigo cada vez que saía à rua. O transito da cidade parecia esmagar-me a alma, as pessoas, sisudas, passavam por mim como quem passa por ninguém. Lembro-me de no início me sentir bem no meio desta multidão, ter a minha tao desejada privacidade, ser dona da minha vida sem que ninguém me apontasse o dedo. Vivia assim, nesta grade cidade. Ate que um dia percebi que o que esta cidade me oferece não é privacidade, mas sim desprezo, o mesmo desfavor que oferece a outros milhares de pessoas, muitas acabam por morrer esquecidas nos seus apartamentos, outras tantas passam a vida sem perceber o valor da solidariedade, a alegria de um bom dia, o amor da fraternidade. Sonhava contigo sempre que saia à rua, até que acordei. Agora decidi regressar a ti, minha querida aldeia, e esta ansiedade de te abraçar e sentir quase dá cabo de mim. O meu amor aceitou a proposta, os filhos apoiaram e nós decidimos regressar. Imaginamos agora a paz de acordar no silêncio de um lar aldeão, o sabor daquele maravilhoso pão, os bons dias e as boas tardes, as festas e os convívios, as caminhadas ate à igreja e as idas ao café... a pé. Coisas simples mas que nos irão fazer felizes. Vamos trocar as compras nos shoppings por coisas tao simples como semear umas sementes, vamos trocar cinemas por bons livros, vamos trocar a privacidade por solidariedade, vamos sentir Portugal. Ai... é tao bom sonhar e sentir o que é real.


Paulo Costa


sexta-feira, 20 de março de 2015

Quando vier a Primavera

Quando vier a Primavera,
Se eu já estiver morto,
As flores florirão da mesma maneira
E as árvores não serão menos verdes que na Primavera passada.
A realidade não precisa de mim.

Sinto uma alegria enorme
Ao pensar que a minha morte não tem importância nenhuma

Se soubesse que amanhã morria
E a Primavera era depois de amanhã,
Morreria contente, porque ela era depois de amanhã.
Se esse é o seu tempo, quando havia ela de vir senão no seu tempo?
Gosto que tudo seja real e que tudo esteja certo;
E gosto porque assim seria, mesmo que eu não gostasse.
Por isso, se morrer agora, morro contente,
Porque tudo é real e tudo está certo.

Podem rezar latim sobre o meu caixão, se quiserem.
Se quiserem, podem dançar e cantar à roda dele.
Não tenho preferências para quando já não puder ter preferências.
O que for, quando for, é que será o que é.

Alberto Caeiro, in "Poemas Inconjuntos"


quinta-feira, 19 de março de 2015

Dia do Pai

Ter um Pai! É ter na vida
Uma luz por entre escolhos;
É ter dois olhos no mundo
Que vêem pelos nossos olhos!

Ter um Pai! Um coração
Que apenas amor encerra,
É ver Deus, no mundo vil,
É ter os céus cá na terra!

Ter um Pai! Nunca se perde
Aquela santa afeição,
Sempre a mesma, quer o filho
Seja um santo ou um ladrão ;

Talvez maior, sendo infame
O filho que é desprezado
Pelo mundo ; pois um Pai
Perdoa ao mais desgraçado!

Ter um Pai! Um santo orgulho
Pró coração que lhe quer
Um orgulho que não cabe
Num coração de mulher!

Embora ele seja imenso
Vogando pelo ideal,
O coração que me deste
Ó Pai bondoso é leal!

Ter um Pai ! Doce poema
Dum sonho bendito e santo
Nestas letras pequeninas,
Astros dum céu todo encanto!

Ter um Pai! Os órfãozinhos
Não conhecem este amor!
Por mo fazer conhecer,
Bendito seja o Senhor!


sábado, 14 de março de 2015

Amendoeiras em flor

A Primavera acordou
porque o sol bateu-lhe á porta
ela ainda bocejou,
mas um pouco estremunhada,
á janela se chegou.
Com tristeza exclamou
e também muito admirada,
com o sol barafustou,
com ele estava zangada.
Abriu os olhos de espanto
não queria acreditar
estava o monte todo branco,
que beleza de pasmar.
Parecia um manto de noiva
no dia do seu noivar.
Sem saber o que dizer,
ali ficou a pensar,
teria ido ao monte,
o seu noivo desposar?
Mas o sol que sempre foi
apaixonado por ela
pra lhe mostrar seu amor,
e rindo da cara dela
disse que não era neve,
são amendoeiras em flor.

Natalia Marques


domingo, 8 de março de 2015

Simplesmente mulher

Teus braços
Fortes braços
Num longo abraço
A me envolver
Teus lábios
Doces lábios
Fonte de beijos
Muitos beijos, pra me aquecer
Quanta coisa emana de ti, doce criatura
Amor… Carinho… Ternura
Tudo que me liga a teu ser, mulher
Tia… Mãe… Avó…
Irmã… Neta… Filha…
Guerreira… Companheira…
Tu que me namoras, me compreendes
Que me incentivas, me repreendes
E jamais me deixas só.
Tu que és dar e receber,
Que com a mesma humildade
Sabes perdoar e esquecer.
Santa ou pecadora
Ingênua ou sedutora
Não importa! Serás sempre uma rainha
Uma intercessora… Uma fada madrinha…
Aquela que na minha aflição, chamo
Laura… Priscila… Mary… Maria José…
A todas, admiro e amo
Santas criaturas
Anjos de candura
Simplesmente mulher!